Vocabulário político para processos estéticos
O projeto Vocabulário político para processos estéticos aconteceu a partir de um encontro, ou de encontros. Encontro no sentido estrito do termo – estarmos juntos num mesmo lugar, para produzir o Vocabulário -, e também encontro como um espaço que possibilita a intensificação de nossas relações de colaboração e aprendizagem, em que experimentamos formas de criação. Esse projeto como espaço de encontro também inaugurou a relação entre pessoas que não se conheciam, e realizou atividades abertas ao público como parte das ramificações do desejo de criar um vocabulário comum. O projeto do Vocabulário foi realizado primeiramente por meio de conversas, experiências e diagramáticas, e, posteriormente, pela escrita e edição de um livro homônimo distribuído gratuitamente e difundido pelo site do projeto.
O projeto tem por objetivo provocar a criação de um Vocabulário num espaço de atravessamento entre práticas políticas, estéticas, comunicativas, afetivas, artísticas etc. Partindo da perspectiva que a criação é também a criação e a transformação de conceitos ou expressões – marcando uma ramificação não linear entre língua, linguagem e significação – , com esse projeto fazemos um levantamento das expressões que nos mobilizam na atualidade, expressões que criamos nós mesmos, ou que transduzimos de outros espaços, estratégias e práticas. O desafio que o Vocabulário propõe é então conversar e escrever sobre as nossas expressões e nossas práticas, aproximando o exercício de fazer um vocabulário do exercício de organizar um glossário, de maneira que essas expressões possam ser compartilhadas e possam proliferar-se em criações comuns. Assim, não vemos o Vocabulário como um projeto que inaugura um modo ou um espaço, mas um projeto que é ele mesmo um espaço de concatenação, ou de ‘síntese disjuntiva’, de outros tantos espaços da criação. Ele nos desloca, contudo, a uma reconfiguração enquanto criadores vocabulosos, menos daquilo que fomos ou somos e mais daquilo que podemos ser e fazer estética e politicamente em uma conjunção temporal, aquilo que podemos juntos vocabulinar.
O Brasil que se conhece pelas ruas desde os levantes de Junho (nesse “ano que não acabou” entre 2013 e 2014) explicita o surgimento de novas expressões, ações e táticas de criação e resistência – um brasiu exaltado contra o poder opressor de um estado que busca crescimento econômico a todo custo, mas cujas minorias vêm sendo definitivamente eliminadas. Como parte de uma tática temporalizada, o Vocabulário se endereça aos espaços comuns afetivos e ativos das ruas e das assembleias, das reuniões e das partilhas, um processo político social que não vemos como encerrado, e procura estender uma articulação aos modos de vida e realidades comuns, abrindo espaço para falar daquilo de que somos constituídos, de nossos desejos, de nossos desafios. O Vocabulário se soma então a esses espaços que ativam a micropolítica da língua e da linguagem, a micropolítica das expressividades, que se valem de um intercâmbio de sensibilidades, negociação de realidades em processo, em conflitos, criando colaborações e proliferando diferenças.
O projeto aconteceu por meio de três formas de encontro: na primeira semana a oficina interna da qual participaram cerca de 25 pessoas chamadas por mim, mais por um desejo de ‘catalização’ (do que de curadoria); a segunda semana com duas oficinas abertas ao público; e a terceira forma de encontro pela troca constante com algumas pessoas durante aquelas semanas no Rio, que se tornaram convites para que essas pessoas escrevessem textos específicos para o Vocabulário. Alguns participantes que haviam sido convidados para a oficina interna e não puderam participar contribuíram com textos. Há ainda uma quarta dinâmica que faz parte do vocabulário que é a incorporação de três textos já escritos e publicados previamente, provocando outras conversas com o Vocabulário.
Cristina Ribas
Participantes / oficina e publicação
Agência Transitiva, Annick Kleizen, Andre Basséres, André Luiz Mesquita, Beatriz Lemos, Breno Silva, Brian Holmes, Cecilia Cotrim, Cristina Ribas, Davi Marcos, Daniela Mattos, Enrico Rocha, Georgiane Abreu, Giseli Vasconcelos, Graziela Kunsch, Helio Oiticica, Inês Nin, Isabel Ferreira, Jeferson Andrade, Josinaldo Medeiros, Julia Ruiz di Giovanni, Juliana Leal Dorneles, Kadija de Paula, Laura Lima, Luis Andrade, Luiza Cilente, Lucas Rodrigues, Lucas Sargentelli, Margit Leisner, Pedro Mendes, Pierre Garcia, Raphi Soifer, RhR, Ricardo Basbaum, Rodrigo Nunes, Sara Uchoa, Steffania Paola, Tatiana Roque, Tiago Régis