Cavalo

Diagrama do Cavalo

 

cavalo_novo diagrama azul

 

Cavalgar em La Borde

// Félix Guattari

 

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Nessa mesma via de compreensão polifônica e heterogenética da subjetividade, encontramos o exame de aspectos etológicos e ecológicos. Daniel Stern, em The Impersonal World of the Infant, explorou notavelmente as formações subjetivas pré-verbais da criança. Ele mostra que não se trata absolutamente de “fases”, no sentido freudiano, mas de níveis de subjetivação que se manterão paralelos ao longo da vida. Renuncia, assim, ao caráter superestimado da psicogênese dos complexos freudianos e que foram apresentados como “universais” estruturais da subjetividade. Por outro lado, valoriza o catáter trans-subjetivo, desde o início, das experiências precoces da criança, que não dissocia o sentimento de si do sentimento do outro. Uma dialética entre os “afetos partilháveis” e os “afetos não-partilháveis estrutura, assim, as fases emergentes da subjetividade. Subjetividade em estado nascente que não cessamos de encontrar no sonho, no delírio, na exaltação criadora, no sentimento amoroso…

A ecologia social e a ecologia mental encontraram lugares de exploração privilegiados nas experiências de Psicoterapia Institucional. Penso evidentemente na Clínica de La Borde, onde trabalho há muito tempo, e onde tudo foi preparado para que os doentes psicóticos vivam em um clima de atividade e de responsabilidade, não apenas com  objetivo de desenvolver um ambiente de comunicação, mas também para criar instâncias locais de subjetivação coletiva. Não se trata simplesmente, portanto, de uma remodelagem da subjetividade dos pacientes, tal cmo preexistia à crise psicótica, mas de uma produção sui generis. Por exemplo, certos doentes psicóticos de origem agrícola, de meio pobre, serão levados a praticar artes plásticas, teatro, vídeo, música, etc quando esses eram antes Universos que lhes escapavam completamente.

Em contrapartida, burocratas e intelectuais se sentirão atraídos por um trabalho material, na cozinha, no jardim, na cerâmica, no clube hípico. O que importa aqui não é unicamente o confronto com uma nova matéria de expressão, é a constituição de complexos de subjetivação: indivíduo-grupo-máquina-trocas múltiplas (des //dobramento / s ), que oferecem à pessoa possibilidades diversificadas de recompor uma corporeidade existencial, de sair de seus impasses repetitivos e, de alguma forma, de se re-singularizar.

Assim se operam transplantes de transferência que não procedem a partir de dimensões “já existentes” da subjetividade, cristalizadas em complexos estruturais, mas que procedem de uma criação  e que, por esse motivo, seriam antes da alçada de uma espécie de paradigma estético. Criam-se novas modalidades de subjetivação do mesmo modo que um artista plástico cria novas formas da palheta que lhe dispõe. Em um tal contexto, percebe-se que os componentes os mais heterogêneos podem concorrer para a evolução positiva de um doente: as relações com o espaço arquitetônico, as relações econômicas, a co-gestão entre o doente e os responsáveis pelos diferentes vetores de tratamento, a apreensão de todas as ocasiões de abertura para o exterior, a exploração processual das “singularidades” dos acontecimentos, enfim tudo aquilo que pode contribuir para a criação de uma relação autêntica com o outro. A cada um desses componentes da instituição de tratamento corresponde uma prática necessária. Em outros termos, não se está mais diante de uma subjetividade dada como um em si, mas face a processos de autonomização, ou de autopoiese, em um sentido um pouco desviado do que Francisco Varela dá a esse termo.

(…)

Fonte: Felix Guattari. Caosmose: um novo paradigma estético. São Paulo: Editora 34, 2006. (p. 16-18)

O título “Cavalgar em La Borde” foi atribuído por Cristina Ribas.

 

Antolhos

// Félix Guattari

 

“ […]  coloquem em uma área fechada cavalos com antolhos reguláveis: o coeficiente de transversalidade será justamente o ajuste dos antolhos. Imagina-se que se forem ajustados de modo a tornar os cavalos completamente cegos, se produzirá um certo encontro traumático. À medida que se for abrindo os antolhos, pode-se imaginar que a circulação se realize de modo mais harmonioso. […] de maneira que os homens se comportem uns em relação aos outros do ponto de vista afetivo.”
Félix Guattari , “ Transversalidade”, em Revolução Molecular, 1981, p. 96. Citado por Ricardo Basbaum em “Em torno do ‘vírus de grupo’”, artigo publicado na revista Lugar Comum 30, Rio de Janeiro, Universidade Nômade e UFRJ, 2012.

 

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A autora da foto não pediu autorização para fotografar.
Passarela 7, Avenida Brasil, entre Maré e Bonsucesso, Rio de Janeiro, Abril de 2014.
Foto: Cristina Ribas

 

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Ato Unificado “Copa pra quem?”, organizado pelo Comitê Popular da Copa, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, e a Articulação dos Povos Indígenas (APIB) Brasília, 27 de maio de 2014.
Foto: Mídia Ninja

 

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Ju saltando (Juliana Dorneles).

 

Poema do Cavalo

// Daniela Mattos

 

com força cavalar e gentil
o olhar do cavalo
bebe o ar e o faz atravessar fluxos
come e mastiga, senta na língua o que irá digerir com todo o corpo
lambe os fragmentos que seu desejo lhe mostra, transforma-os fazendo esfarelar
na boca

 vocabpol em 21122014 conversa, criação, diagrama, oficina