Pequeno ajuntamento de postagens/pensamentos sobre um pedaço de realidade**
// Davi Marcos
Aumentou tudo no Rio, principalmente o nível do caos, seria por acaso?
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No jornal diz que será um soldado do exército para cada 55 moradores da Maré, mas não diz quantos médicos, quantos educadores, quantos dias de coleta de lixo, quantas novas vagas de emprego…a lei do fuzil do Estado não difere muito da lei do fuzil do bandido.
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Eus…
A vida é dura, não se pode esmorecer…
A chapa é quente, não pode dar mole…
Aquilo que não aprendemos nos engole…
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Estalando
Toda hora tem, gritou o “menó”
Vai vem frenético, se liga, aqui ó
Fogos, estalando, um chicote novo, eminência fatal para o povo
Chapa quente, gato preto, corre pro beco
Rápido, languido, quando corre quase não toca o chão
Parece vapor, tem carga nova, difícil botar a mão
Alma ainda correndo, após o estampido, ecoa o sangue no ouvido
Dizem que tava no veneno, era ainda menino, pouco mais de 12
Talvez o artigo, também o calibre que o acertou, em sua última pose
Na linha do jornal era um gerente, mais um, menos um, pra muita gente
Na favela onde morava, um menino da boca e na realidade uma criança
Que depositara seu sonho, sua esperança, com toda confiança
“Lado certo da vida errada” era assim que via, que vivia, essa era a parada, dia a dia
Na sua curta estrada que a falta fia
A fila anda…pra boca e a barriga “não ficar vazia”
Estalando de novo, estalando, de novo…estalando!!!
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Um pouco da pressão do lado de cá
No caminho, vi muitas pessoas aderindo ao “vamos vencer na vida de qualquer jeito” muitos viraram ladrões, traficantes, estelionatários e tantos outros viraram policiais. Um dia no RocK in Rio em 2001, fui abordado por dois policiais na beira da rua, onde tinha um matagal que as pessoas estavam usando como banheiro, quando me perguntaram o que estava fazendo ali, respondi enquanto subia o fecho-ecler da calça, que estava criando uma alternativa para a falta de banheiros públicos, um deles, o mais velho, me chamou de engraçadinho, o outro, bem mais jovem, veio me revistar, ele gaguejava ao falar comigo. Olhei por baixo das sombras do boné da PM e reconheci o policial que me revistava, no impulso o chamei pelo apelido que sempre o usava na rua de Olaria: Gaguinho?
Levei um tapão na cara, aos berros de “tá maluco, seu filho da puta?”
O policial mais velho já mandava me esculachar, daí segurei meus cabelos, que eram grandes na época, fiz um rabo de cavalo, assim o policial mais novo pode ver melhor o meu rosto, ao me reconhecer me abraçou, chorou e pediu desculpas, ao final ainda chorando ele disse que a pressão que sofriam era muito grande. O policial mais velho, com cara de decepcionado disse para parar com aquela cena e que só faltava nos dois nos beijarmos, o Leandro me colocou para dentro do show e vi os últimos minutos do Red Hot Chili Pepers, nunca mais o vi, agora vejo em jornais, matou a namorada.
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O maior espetáculo da TERRA
No proscênio, tem um gênio
E seus desejos realizados
Transformam todos em errados
Muitos são enterrados
Silvos, uns mortos e outros vivos
As vias de fato Assim como gato e rato
Minha alma/poesia dói
Fico num só desconstrói
Quem dera fosse herói
Os meios para os fins
São tipo assim Balas, gases, bombas
Menos marfins e mais trombas
Não d’água, mágoa
São valas aos infernos abertos
É sangue de Marias, Josés, DGs e Adalbertos
É bonde e não gangue
Nosso espetáculo de sociedade
Só não é mais absurdo que nossa realidade
Se foi por acidente, não sabemos
Mas o preço de qualquer coisa pagaremos
Com a moeda dos lamentos, desde de 22 de Abril de 1500
Invasão maior ainda não se viu
Mandaram os putos pra puta que pariu, olha o que disso tudo surgiu
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Retrovisor
Por ventura sejas agraciado
Por aguardada mudança de lado
Não te esqueças da origem
Que sujou teu rosto de fuligem
Pois as maquiagens não poderão ocultar
O que pra sempre dentro d’alma estará
Raiz que em momento crítico te afetará
Que em luzes diversas não se apagará
Pois sem tais bases de ser
Jamais seguiria um simples entender
Efêmero, és Sorte ou revés
Eterna é a mudança
Em tempo, ser sempre criança
No vento, esperança dança
A vida não permite fiança
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Não dou conta da realidade, reinvento cada ponto que puder…
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Bom dia favela
Quando se entra na favela, de verdade, ela nunca mais sai de dentro do ser, a favela fica e de alguma forma se manifestará n’alma. Favela não é um espaço, é uma vibração.
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Pobre, porrada
Rico, empreitada Copa furada De tudo ou nada Tudo pra quem? Retira de alguém/ninguém Suas naves vem Pára tudo, torcida, amém Esmo além do real A esmo, nós, foi mal Soldados contra nós É nós Somos nós Contra nós Vítimas e algoz Em nome deles, por eles Com nosso dinheiro Nosso suor Nosso sangue E tudo ao redor Nada mais nos pertence Força de trabalho, corpo ou a vida que se vende Ninguém (se) entende?
Davi Marcos. Fotografia da bomba de gás usada pela PM em frente ao Observatório de Favelas.
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Temos mais em comum do que se pode aceitar
Sabe aquele policial que está ali? Hã…?
Também é pobre.
Quem dá ordem para a polícia cumprir?
Violência é uma questão de classe.
A multidão que lincha o fugitivo, é pobre.
O moleque que furta o cordão de forma violenta, é pobre
O ladrão que usa uma faca, é pobre
O assaltante que segura a pistola, é pobre
O bandido que segura o fuzil, é pobre
O policial que segura o fuzil, é pobre
O soldado do exército que segura o fuzil, é pobre
O segurança privado que segura o 38, é pobre
O guarda municipal que segura a arma de choque e o porrete, é pobre
A multidão que reage de forma violenta, é pobre
Quem lucra com a violência?
A quem o pobre serve através da violência?
Devemos ser violentos?
AMOR É ARMA
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O vulto ou a volta
O vulto volta
A volta vulto
O vulto deu a volta
A volta deu o vulto
Vulto e volta
Volta e vulto
Vulta Volto Voluta
O vulto ou a volta?
O vulto é a volta
A volta é o vulto
Volta Vulto Volta Vulto Volta…
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Transgrido quando incomodo o conservador, mas vou além quando faço o mesmo com a vanguarda.
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Família relatou sobre adolescente levado pelo exército na Nova Holanda agora, as mulheres estavam com os rostos e olhos vermelhos, disseram que era por causa do gás de pimenta.
—-Os soldados do exército que estão na Maré, são tão novos quanto os moleques do tráfico e tem o mesmo perfil, em maioria negros e de classe popular.
—-Sobre uma matéria do jornal O Dia:
A mídia descobriu uma nova comunidade na Maré, estava lá há 30 anos e nessa levada ressalto essa frase, que pra mim é exemplo do que faz o bolsa família :
”Desempregada desde que descobriu que estava com Aids, há oito anos, Ana sustenta os filhos com apenas R$ 290 que recebe do Bolsa Família. As crianças, de 17, 8 e 5 anos, estão matriculadas na escola. Todos dormem em um único colchão, achado na rua.”
Matéria Jornal O Dia
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CA MINHA
MINHA ARTE
MARTE MINHA
LE VINHA
CAL MINHA
AD VENTO
DE TALHOS
NOS MALHOS
DA CALMA
AD QUERIDA
ARTE MINHA
MINHA VIDA
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HoloSortes
Circo e cerco, armados
Senhoras e senhores, acuados
Desejando a paz, o fim da guerra
Vivendo o clima de invasão da terra
São homens e não alienígenas
Brancos, negros e indígenas
Fluxo de vídeo em tempo real?
Reality Show, sensacional…
Aqui larga o aço, é pão escaço
Nesse circo, é nós o palhaço
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** Seleção de escritas de Davi no seu perfil facebook entre 2013 e 2014